Escrever é se partir em fragmentos

março 28, 2021

 

João Não é Ninguém / Behance

Estive pensando após publicar o conto sobre minhas intenções ao escrevê-lo. Fui provocada e instigada a pensar no porquê eu havia escrito aquilo e as razões que me levaram a escrever a maioria das minhas histórias.

Algumas perguntas que sempre me fazem (e que sempre me faço também) é se aquele personagem sou eu. O que eu estava passando no momento em que pus aquela narrativa no papel? Que sentimentos me atingiam?

A grande verdade é que não sei, não me lembro. Então sempre dou um jeitinho de dar alguma resposta enquanto reflito “que diabos eu estava pensando quando escrevi isso?”. Mas o pensamento e o sentimento já passaram, deixando só o fruto deles.

Cada vez que escrevo, um pedacinho de mim vai embora e outro chega para que eu possa me renovar sem que tudo se dissipe. Acho que escrever é isso, se fragmentar.

Não, o personagem principal das obras que escrevi não sou eu. Eu nem sequer conheço alguém com essas características. Mas talvez tenha li um pouquinho de mim, um pouquinho de alguém que passou pela minha vida, um pouquinho que inventei. E é essa construção de pouquinho em pouquinho que traz essa singularidade.

Cada personagem é um mundo, assim como cada pessoa é um mundo.

Mas posso dizer sim que as vezes os baseio em mim. É impossível não se basear na própria vida. O autor é um indivíduo inserido no mundo, ele aprende com o que vê e sente. Talvez exista algo de narcísico na escrita, mas isso é perdoável (nem sempre). No fim das contas, cada personagem carrega um pouquinho de quem o criou.

Acho que é isso, o personagem da minha criação talvez seja eu e o protagonista da sua criação talvez seja você. Porque quando nos aprofundamos em uma criação, ela revela também coisas sobre nós mesmos que não sabíamos antes.

Não que eu coloque minha personalidade no personagem, mas eu penso “vou fazer com que ele faça algo que eu faria se tivesse coragem”. Para mim essa é a melhor parte dos personagens literários, eles podem ser bem mais corajosos que as pessoas reais.

Por isso, escrevo para demonstrar indiretamente o que sinto. Não que eu esteja passando ou sentindo a mesma coisa, eu pego a essência do sentimento e o transformo em alguma história.

Assim posso manter o segredo enquanto desabafo. Isso é exatamente o que estou fazendo agora. Mas sobre o que exatamente estou desabafando? Não faço a menor ideia.

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